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sábado, março 07, 2015

“Um dia tens de emprestar livros a F.!"



crónicas de um bibliotecário-ambulante

"um dia tens de emprestar livros a F!"
- "um dia tens de emprestar livros a F.!
- Claro que sim. Ela que venha e escolhemos.”.
As semanas passavam e nem sinal. Num qualquer dia quente de Verão, época de retornos dos migrantes, que partiram em busca de novas linhas profissionais e pessoais,a F. surgiu!
Amparada e ladeada por duas familiares (irmãs), o olhar infantil, ingénuo, terno e deslumbrado ao entrar dentro da Bibliomóvel destacou-se. Percorreu o exíguo espaço, ainda mais apertado pelo número de pessoas instaladas e foi avaliando as presenças e as existências arrumadas nas prateleiras.
-“Este já li. Estes tenho lá em casa. Gostei muito deste… Gosto muito desta escritora!”
- Ela gosta muito de ler! A melhor prenda que lhe podemos dar são livros.”
O tom paternalista das familiares estranhou mas percebi imediatamente a razão. F. é mulher feita no físico mas juvenil no intelecto e criança no pensamento e imaginação.
A leitura é um dos seus maiores e melhores prazeres. Leitora de “clinica geral”, embora prefira romances que assaltem e revolvam as emoções. Fiquei feliz pela conquista!
Na passagem seguinte, esfregava as mãos de contente por ter angariado uma nova leitora e uma nova visita para a “sala de leitura ambulante”. Não apareceu. Perguntei e percebi pela resposta, que tal se devia á dificuldade de sair sozinha da segurança da sua casa.
Desde aquele dia em que entrou, visitou a Bibliomóvel e requisitou cinco livros, nunca mais a vi. Nunca mais falei com ela.
Entregou (mandou entregar) os cinco livros e disse (mandou recado) que tinha gostado muito de os ler.
Uma solução de engenharia funcional com vista a satisfação do visitante/utilizador/Amigo precisava-se. Arranjou-se!
Desde aquele dia F. é uma das nossas melhores leitoras, no volume de requisições e mais fácil de contentar com as escolhas feitas, muitas vezes de olhos fechados, mas de coração aberto por saber que nenhuma será rejeitada.
Apesar de nunca ter voltado a entrar dentro da Bibliomóvel, arranjei um Mercúrio - (deus romano) mensageiro dos deuses, que solicitamente nunca se negou a protagonizar esse papel especial de intermediário entre um almocreve das letras e de um dos seus melhores clientes.
Estas mensagens de palavras escritas e sentidas por outros, são trocadas quinzenalmente ou mensalmente, consoante o seu ritmo de leitura. Sem obrigações e sem preocupações com datas, fichas de requisição ou qualquer outro obstáculo burocrático. Nunca preenchi fichas de requisição e nunca houve oportunidade de fazer o cartão de utilizadora! Mas existe nos registos funcionais e sentimentais desta Biblioteca.
Esta troca comercial feita de palavras escritas e sensações de dever cumprido entre três parcelas, separados entre si mas juntos nesta sinergia de esforços para que se cumpra e faça acontecer Biblioteca Pública.
- “Um dia tens de emprestar livros a F.!
- Claro que sim. SEMPRE!”







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